QUEM VEM COMIGO

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

NUNCA MAIS



Um sotaque perdido, talvez de uma vida anterior a esta, me surpreendeu enquanto recitava poesia na concha da sua orelha em leito de lençóis amarrotados.
Parei, paramos assustados.
De que longe passado, de que espaço, havia saído assim, fugido de mim, esse enrolar de língua doidamente machucado?
De que pedaço esquecido na memória do tempo, de que dobra da pele, de que desconhecimento, de que peça ou filme, de que partida fantasia, de que ilha abrigada no meu peito?
De onde saiu esse idioma desconhecido que nos feriu ouvidos? Com certeza não veio desse leito.
Veio de tão fundo que nos deixou entorpecidos e até o amor perdeu os seus habituais ruídos.
Fizemos um amor novo, estranho e diferente, como crentes em silêncio profundo, e nos reconhecemos além desse mundo num globo perdido no espaço e no tempo.
E descobrimos que a gente vem amante faz tantas vidas que não há mais saída, nos achamos entre laços e espirais, por mais que o deserto nos apague os passos. Estamos condenados ao ancoramento num mesmo cais.
Nunca mais haverá um nunca mais...
[elza fraga]

4 comentários:

  1. E eu te odeio tanto, e te amo tanto que não tem mesmo explicação pra isso nessa vida. Na certa cruzamos em outra vida e de alguma forma nos magoamos muito. Enfim, você descreve com muita delicadeza poética, o que a realidade no mostra no tranco.

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  2. Respostas
    1. Eu flutuo quando escrevo, é uma maneira de me situar no plano. Não sou daqui, rsrs

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Um doce pelo seu pensamento